domingo, 20 de abril de 2008

Pra Brasileiro Ver


Tudo começou em 1967, quando Gilberto Gil, à procura de uma banda para acompanhá-lo no 3o Festival da Música Popular Brasileira, procurou o grande maestro Rogério Duprat em busca de uma indicação. O maestro indicou uma jovem banda de São Paulo que tocava um estilo de música completamente diferente de tudo o que já se havia ouvido no circuito musical do Brasil. Essa banda era Os Mutantes.
O resultado da junção foi a apresentação da música Domingo no Parque, que tirou segundo lugar naquele festival. A performance impressionou até mesmo Duprat, que era conhecido por suas incursões experimentalistas muito além da vanguarda da época. Ele já tinha em mente o projeto de fazer um disco que misturasse a música pop que vinha sendo feita pelos Beatles e popularizada pela Jovem Guarda e misturá-la com ritmos brasileiros e pitadas de música clássica.
Viu na junção entre o swing de Gilberto Gil e as guitarras e sintetizadores dos Mutantes o seu projeto se tornando realidade. Nascia assim, em 1968, A Banda Tropicalista do Duprat, disco que era exatamente essa fusão, mas que não contou com os baianos que mais tarde consagrariam o movimento Tropicalista. O álbum foi composto por uma orquestra regida por Duprat tocando junto com os Mutantes interpretando composições brasileiras antigas e sucessos dos rapazes de Liverpool.
Na época, o LP foi considerado apenas uma releitura de canções importadas e foi encarado como uma forma de desvirtuar clássicos do cancioneiro popular, como Chiquita Bacana, ou Canção pra Inglês Ver, de Lamartine Babo, e logo foi tirado de catálogo.
Realmente, é um álbum em que não faltam releituras “anormais” e arranjos estranhíssimos para uma época em que a Bossa Nova tinha apenas 10 anos. O trabalho é baseado apenas em pegar músicas já existentes e arranjá-las de uma nova diferente; Instrumentos de orquestra preenchem a simplicidade do banquinho-e-violão, enquanto o rock n’ roll tupiniquim dos Mutantes entra com cara de “novidade”.
Tecnicamente falando, não é um disco de vanguarda, nem mesmo para a época, já que não foram usados recursos mirabolantes de estúdio, ou tempos cruzados e “tortos” durante a gravação. Todo o disco foi gravado em uma mesa de quatro canais e praticamente tudo é feito numa base quatro-por-quatro; nada mais direto. As distorções e os efeitos das guitarras (apesar de muito bem explorados) não são nenhuma novidade para um público que assiste Roberto Carlos e cia na TV.
Porém, em outra análise, o disco significou muito mais: enquanto o violão era o símbolo da música nacional, as guitarras elétricas com agudos estourados de Sergio Dias é que davam a tônica das músicas. Enquanto o samba e o chorinho eram a cara do Brasil, em A Banda... logo depois de um frevo completamente eletrificado entra uma música dos Beatles, cantada com o inglês paulistano de Arnaldo Baptista.
O mérito dos músicos da Bossa Nova de misturar o cool jazz da Califórnia com o samba da Bahia e o choro carioca, com esse disco foi levado a outras conseqüências. Se a música brasileira hoje é conhecida por agregar todos os estilos, muito dessa raiz híbrida está nesse projeto de Duprat, que tem como principal trunfo unir todos os estilos de música em uma coisa só.
A Banda Tropicalista do Duprat é um verdadeiro tratado, um manifesto. Não só por ter lançado os Mutantes e nem por ter fundado o movimento Tropicalista, mas por ter conseguido fazer música brasileira com muito mais do que um banquinho e um violão.


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